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Em ação na Justiça, Ministério Público busca barrar evento de 2 mil pessoas com Bolsonaro em Presidente Prudente
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3 anos atrásem
O Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP) ingressou na Justiça com uma Ação Civil Pública com pedido de liminar para que a Prefeitura de Presidente Prudente (SP) não realize um evento com 2 mil pessoas para recepção do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), que tem agenda prevista no município para o próximo sábado (31).
A Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Presidente Prudente (Secom) informou que o município ainda não foi citado sobre a ação e que só após ser citado oficialmente vai se pronunciar.
Na ação, protocolada na Vara da Fazenda Pública da Comarca de Presidente Prudente, o promotor de Justiça Marcelo Creste pede que o Poder Judiciário determine pena de pagamento de multa de R$ 2 milhões.
O MPE ainda solicita que, para a recepção do presidente da República, a Prefeitura não realize, execute, promova ou permita qualquer atividade ou evento, não especificamente previsto no Plano São Paulo, que “gere aglomeração de pessoas”, pena de pagamento de multa de R$ 2 milhões, sem prejuízo das responsabilidades penal e civil.
O evento com o presidente da República está previsto para ocorrer no Recinto de Exposições Jacob Tosello, localizado na Rodovia Raposo Tavares (SP-270). Oficialmente, Bolsonaro estará na cidade para formalizar o credenciamento do Hospital Regional do Câncer junto ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Pandemia
O promotor cita na ação a pandemia da Covid-19 e que para a contenção do vírus foram tomadas várias medidas, entre as quais a quarentena, que foi instituída no Estado de São Paulo, inicialmente, pelo Decreto nº 64.881, de 20 de março de 2020. Posteriormente o Estado se viu obrigado a permitir a retomada de algumas atividades econômicas e lançou o Plano São Paulo, com o objetivo de implementar e avaliar ações e medidas estratégicas de enfrentamento à pandemia.
Depois, mesmo sem o enfraquecimento da pandemia, mas diante das condições econômicas, o governo estadual instituiu a fase emergencial do Plano São Paulo, que foi prorrogada até 31 de julho de 2021.
“E, no que toca a ‘eventos, convenções e atividades culturais’, por ora não estão permitidos. E, ainda que estivessem permitidos (fases laranja, amarela e verde), algumas regras são imprescindíveis para a realização”, esclarece o promotor.
Creste aponta que independentemente da fase, enquanto não houver norma expressa, as demais atividades que geram aglomeração estão proibidas.
Megaevento
O promotor cita na ação que no dia 31 de julho de 2021 o município de Presidente Prudente receberá a visita do presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, que fará a inauguração do credenciamento junto ao Sistema Único de Saúde (SUS) do Hospital Regional do Câncer.
“E, para receber o Exmo. Presidente da República, o município prepara um megaevento no Recinto de Exposição de Presidente Prudente, com a estimativa de público de até 2.000 pessoas”, diz o promotor.
Creste aponta na ação apresentada à Justiça decretos publicados pela Prefeitura a respeito do evento.
“Ou seja, em plena pandemia, o Governo Municipal de Presidente Prudente pretende fazer um megaevento que não está permitido pelas normas sanitárias estaduais, posto que a normativa municipal acima citada não encontra respaldo em nenhuma autorização, ainda que excepcional ou transitória, da Autoridade Sanitária Estadual”, pontua o membro do MPE.
No documento, o promotor faz uma comparação do evento a ser realizado em Presidente Prudente, o qual se refere como “absurdo sanitário”, com os eventos testes anunciados pelo governo estadual.
Segundo Creste, os eventos testes anunciados pelo Estado têm protocolo específico e rigoroso esquema de proteção sanitária, que incluiu a vacinação do público, testagem e rastreamento/monitoramento de contatos.
Para fazer o “megaevento” pretendido pelo governo municipal, além de autorização da autoridade sanitária estadual e do cumprimento dos comuns protocolos de segurança sanitária, o promotor afirma que são necessários os seguintes requisitos específicos:
- Avaliação técnica-científica e epidemiológica da quantidade de pessoas que o evento poderá receber.
- Todos os participantes e convidados do evento têm que estar vacinados;
- Todos os participantes do evento devem ser testados na entrada;
- Todos os participantes do evento devem ser monitorados após o evento, inclusive com nova testagem;
- Protocolos sanitários específicos para cada evento.
“Ora, o Governo Municipal pretende fazer um megaevento para até 2000 pessoas, que podem vir das mais variadas regiões do país, tão somente com o uso de máscara, fornecimento de álcool em gel e medição de temperatura, protocolos que qualquer mercearia é obrigada a respeitar!” declarou Creste.
“Realmente, analisar como funcionam as aglomerações no mundo real é de suma importância, até para que a liberação total da economia possa ser feita com critério e segurança, sem expor a risco a vida do cidadão e a saúde pública. E para esse tipo de análise é imprescindível rigoroso e específico protocolo de segurança sanitária, de testagem e de monitoramento/rastreamento de contatos, até porque, em alguns eventos, a transmissão foi significativa, como a que ocorreu na Holanda, quando cerca de mil pessoas foram contaminadas pelo coronavírus”, prossegue o promotor.
Creste afirma que os protocolos utilizados em eventos testes não existem para o evento a ser realizado em Presidente Prudente.
“Só de comparar as protocolos e requisitos sanitários para os eventos testes, previamente aprovados e selecionados pelo Autoridade Sanitária Estadual, com o megaevento que o Governo Municipal pretende realizar, já se conclui pela irresponsabilidade sanitária. E o cenário anunciado pelas redes sociais é assustador”, diz o representante do MPE.
“E, data venia, há uma agravante. É que nos ‘eventos’ que ocorreu a presença do Exmo. Presidente da República a violação das normas sanitárias e a aglomeração de pessoas foram fatos corriqueiros, data venia”, diz o promotor.
Zombar de mortos
Creste afirma que a Prefeitura de Presidente Prudente não tem quantidade de pessoal com a qualificação e capacitação necessárias para agir na fiscalização sanitária do evento.
“Como fazer respeitar o máximo de 2000 pessoas? Como controlar essas pessoas no local? Serão testadas? Serão acompanhadas depois? Estão todas vacinadas? Como controlar o uso de máscaras no local? Como controlar o distanciamento social no local? Data venia, tudo indica que esse megaevento é uma ode ao coronavírus”, declara o promotor.
Na ação, o membro do MPE diz que não é porque os números da pandemia estão caindo que se deve baixar a guarda e agir com irresponsabilidade.
Nesta terça-feira (27), a taxa regional de ocupação de leito de UTI Covid é de 56,7%. Mas, em outubro de 2020, com muito menos leitos, a ocupação chegou a 32% para, depois, em dezembro, começar a subir e ultrapassar 100% ao longo do primeiro semestre de 2021, com dezenas de pessoas morrendo em Pronto-socorro enquanto aguardavam vaga em leito UTI Covid, segundo a ação.
O promotor afirma que ainda que hoje exista a vacina, é certo que apenas 20,75% da população paulista está com o sistema vacinal completo, sendo certo que a proteção coletiva e até mesmo a individual somente virão com as duas doses em no mínimo 70% da população, o que é estimado para dezembro de 2021.
“A isso, soma-se a agravante de que já existe a transmissão comunitária da variante Delta, que é extremamente mais transmissível e contagiante, mesmo em pessoas vacinadas. Por esses motivos, não dá para brincar com o vírus. Fazer o evento pretendido pelo Governo Municipal é convidar o vírus para dançar e, data venia, zombar das mais de 550.000 pessoas mortas e do luto de seus familiares, em especial dos 830 prudentinos mortos”, declarou Creste.
O membro do MPE aponta que, a despeito da melhora do índice hospitalar da região, a situação epidemiológica do município de Presidente Prudente ainda é bastante preocupante. Conforme o boletim da Vigilância Epidemiológica Municipal desta terça-feira, a cidade recebeu mais 102 resultados positivos da doença e as confirmações subiram para 32.568. Mais uma morte foi confirmada e os óbitos por coronavírus chegaram a 830. Presidente Prudente tem 86 moradores hospitalizados, sendo 30 em UTIs.
O promotor afirma que o município pode e deve bem receber o presidente da República.
“Contudo, em tempos de pandemia, com mais de 550.000 mortos, não é hora para uma recepção com megaevento. Data venia, realizar esse megaevento ou esse tipo de recepção na pandemia é zombar dos milhares que morreram e do luto de seus familiares, bem como de todos os setores econômicos, que, com sacrífico, tiveram que suportar as consequências econômicas da quarentena imposta pelas autoridades sanitárias”, declarou Creste.
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