Por Aguinaldo Adelino Carvalho
Nos últimos anos, temos observado um alarmante crescimento dos afastamentos do trabalho devido a problemas de saúde mental. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) registra ano após ano um aumento no número de trabalhadores que, diante do adoecimento psíquico, acabam incapacitados não apenas para o trabalho, mas também para a convivência social e outras dimensões da vida. Esse cenário levanta um alerta crucial: o ambiente profissional precisa ser repensado com um olhar mais atento ao bem-estar emocional dos colaboradores.
A recente atualização da Norma Regulamentadora 1 (NR-1) do Ministério do Trabalho reforça essa necessidade. Agora, as empresas devem incluir em seus Programas de Gerenciamento de Riscos (PGR) a identificação de riscos ocupacionais relacionados à saúde mental. Antes, as preocupações se concentravam principalmente nos riscos físicos, químicos, biológicos e ergonômicos. Com essa mudança, abre-se espaço para uma abordagem mais ampla e humanizada, que reconhece os impactos emocionais e psicológicos da rotina laboral.
O trabalho é mais do que uma simples atividade produtiva: ele é parte essencial da identidade do sujeito. Somos, muitas vezes, reconhecidos pela profissão que exercemos, e isso nos insere em um contexto social e relacional profundo. No entanto, quando as condições de trabalho não são saudáveis, o trabalhador pode sofrer um esgotamento emocional que compromete não só seu desempenho profissional, mas também sua qualidade de vida.
A psicodinâmica do trabalho, proposta por Christophe Dejours, nos ajuda a compreender como as relações de trabalho podem ser fontes de sofrimento psíquico ou de realização pessoal. Dejours argumenta que o sofrimento pode surgir quando há um descompasso entre as exigências do trabalho e os recursos internos do trabalhador para enfrentá-las. Quando esse sofrimento não encontra espaços legítimos de expressão dentro da organização, ele pode se transformar em adoecimento psíquico.
Além disso, Dejours destaca o papel central da cooperação e do reconhecimento no ambiente de trabalho. A falta de valorização e de apoio social pode agravar os impactos negativos das pressões laborais, levando a um aumento da ansiedade, depressão e outras patologias relacionadas ao trabalho. Dessa forma, promover um ambiente organizacional que favoreça o reconhecimento e a cooperação não é apenas uma questão ética, mas também uma estratégia eficaz para prevenir o sofrimento mental.
Diante disso, é fundamental que as empresas se tornem espaços que promovam a saúde emocional. Ações como a criação de ambientes mais acolhedores, a implementação de políticas de prevenção ao adoecimento mental e o incentivo a práticas de autocuidado são passos essenciais para garantir que o trabalhador se sinta valorizado e respeitado. Afinal, pensar na saúde mental dos colaboradores não é um custo, mas sim um investimento. Empresas que promovem o bem-estar tendem a ter equipes mais produtivas, criativas e comprometidas, reduzindo taxas de absenteísmo e afastamento.
Vivemos em uma era de grandes transformações tecnológicas, onde a automação e a inteligência artificial assumem papéis cada vez mais significativos. O historiador Yuval Noah Harari alerta para o risco do surgimento de uma “classe inservível”, composta por pessoas excluídas do mercado de trabalho devido à substituição por máquinas. Isso reforça ainda mais a urgência de um olhar humanizado para o trabalho e para aqueles que o realizam.
Não podemos construir uma sociedade equilibrada, organizada e acolhedora se ignorarmos o sofrimento humano dentro das organizações. Empresas, igrejas, ONGs e todas as formas de organização social precisam compreender que, no final das contas, a vida só tem sentido quando somos verdadeiramente humanos.